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  • Quais regras a UCI criou para o ciclismo e porque ela precisa parar com isso

    Quais regras a UCI criou para o ciclismo e porque ela precisa parar com isso

    Nos últimos anos a UCI criou algumas regras que geraram certa polêmica, com a maioria dos ciclistas discordando delas. Algumas foram até revogadas, tamanha a indignação que foi gerada

    Vamos começar pelo principal: proibir as posições supertuck e aerotuck beiram o ridículo – é a minha opinião pessoal. Alguns fãs do ciclismo discordam de mim, então que fique bem claro que vocês lutam por esse direito: de serem proibidos de pedalar como querem.

    Para quem não conhece as posições proibidas, supertuck e aerotuck é quando o piloto tira as mãos do guidão e coloca os antebraços ali, simulando um clip aerodinâmico que não existe, e quando ele sai do selim da bike e senta no quadro, ficando em uma posição muito aerodinâmica, mas com a pilotagem totalmente dificultada.

    Então acompanhem aqui o meu raciocínio: a UCI precisa mesmo ensinar os atletas a pedalarem com segurança? O fato de uma posição trazer riscos para a pilotagem, faz com que ela tenha que ser proibida? Mas afinal, quem é o responsável por pedalar a bike, se arriscar nas descidas e atacar na chegada? Os pilotos ou a UCI? Quem é o cara que treinou a vida inteira para ganhar uma camisa amarela por 2 segundos de diferença do segundo lugar? Quem foi que testou pneus, quadros, geometrias e aprimorou a pilotagem com cada um desses? Quem é o cara que trocou toda a segurança de uma vida no escritório para ser atleta profissional? É sério que tem alguém que precisa ensinar esse cara a tomar decisões de segurança durante o pedal?

    Não estou dizendo que esse cara não erra, mas que se ele errar, são ossos do ofício que ele escolheu. Ninguem pode tomar as decisões por ele.

    Aí vem um argumento bem popular: “Quando um atleta pratica uma pilotagem tão agressiva, ele dá um exemplo ruim para quem o está assistindo, levando amadores a tentarem o mesmo e acabarem se machucando”.

    É como se precisássemos colocar de novo aquele aviso dos anos 90 no cantinho da TV: “Não tente fazer isso em casa”, mas mesmo assim, o espectador soa como um ignorante que sofre todo tipo de má influência para tomar decisões ruins na sua vida.

    Francamente, neste caso acho que a gente deveria proibir o Red Bull Rampage, por que muita gente vai tentar dropar do sexto andar do prédio, afinal, é isso que a gente vê os caras fazendo lá em Utah.

    Fabio Wibmer deveria ser preso, pois alguém vai tentar descer uma escadaria dando um back-flip como ele e acabar em uma cadeira de rodas.

    E é assim que a gente nivela por baixo: proibindo que os mais ousados tomem as suas próprias decisões e riscos, porque os que vivem na margem da segurança e conforto não querem correr nenhum risco – nem mesmo o de sofrerem alguma possível influência.

    Aprendam de uma vez: crianças que forem influenciadas a fazer supertucks, aerotucks e back-flips são os potenciais campeões de amanhã.

    Me lembro de um projeto de lei que surgiu de um político aqui no Brasil, que propunha uma lei para proibir que empresários utilizassem nomes estrangeiros em suas empresas. A princípio parecia que o argumento seria por algum protecionismo à língua portuguesa, mas isso não faz o mínimo sentido na atual sociedade em que procuramos integrar nações e globalizar as culturas. Aquele negócio de “é proibido falar outro idioma aqui” já virou um conservadorismo que não se encaixa aos dias atuais.

    A explicação para o projeto de lei era que, os empresários que escolhessem nomes estrangeiros estariam fadados ao fracasso, portanto a nova lei iria ajuda-los a serem mais bem sucedidos.

    Eis aqui um belo exemplo do burocrata que não empreende, tentando ensinar o empreendedor, ja calejado de experiência.

    A UCI é um órgão burocrata, formado por senhores que não competem, mas tentam ensinar o competidor. Competidor calejado, também.

    Quem diria que na década de 90 o Pantani estava pilotando errado, quando descia as montanhas do Tour de France em um Aerotuck totalmente agressivo, criando uma fuga que jamais vamos esquecer. A UCI deveria ter ensinado ele a andar de bicicleta corretamente, não é?

    E os pilotos de MTB, que vez ou outra tiram as bikes do chão durante saltos? Vamos proibir isso aí pois eles podem se machucar – como de fato realmente já acontece eventualmente – e ainda podem criar influências ruins para os amadores e crianças também se machucarem. E se a gente proibisse também que eles tirem uma das mãos do guidão? Criaria mais segurança ne? Exemplos melhores ainda! Esses últimos dois parágrafos contêm ironia e sarcasmo, ok?

    Outra regra foi tão criticada que, precisou ser revogada imediatamente: proibir que os atletas descartem suas caramanholas em qualquer lugar. A ideia era criar uma lei para aparentar mais sustentabilidade no esporte, para dar um exemplo de não jogar lixo nas rodovias. Acontece que essas garrafinhas de água quase nunca chegam a encostar no chão, pois sempre algum espectador pega ela como uma lembrança épica, para guardar para sempre. Nunca criaram poluição.

    Mal sabia a UCI que a o significado de sustentabilidade tem três pilares: preservar o meio ambiente, preservar a economia e preservar a identidade de algo. As caramanholas arremessadas para o público nunca tiveram nenhum impacto negativo no meio ambiente, mas construíram a história do ciclismo e seus fãs que viajavam de longe para assistir os seus ídolos e terem a oportunidade de, talvez, conseguir levar uma garrafinha para casa. A proibição disso foi um impacto enorme na identidade do nosso esporte. Zero sustentabilidade, pois arruinou um daqueles pilares.

    Outro argumento que certamente vai surgir: “Então você acha que as regras são ruins?”

    É claro que não. Quando a UCI cria regras como a proibição de mudança de linha durante um sprint, aí sim ela está colaborando para a real segurança e entendimento dos atletas. Você não pode fechar um adversário (seja em supertuck, aerotuck ou com as duas mãos no guidão), por que aí já passa a ser um problema que envolve a lealdade com o próximo. Deve existir um combinado sobre a conduta de pilotagem entre os atletas.

    Na verdade, sempre existiram vários combinados de conduta dentro do pelotão, a maioria deles não está descrito em regras da UCI, e fucionam muito bem, com as devidas fiscalizações e auditorias internas entre os atletas. O acordo entre cavalheiros sempre funcionou muito bem no ciclismo, mas obrigado pela preocupação, caros burocratas que não competem mais – ou que não aprenderam a descer a 90 km/h em posição aero.

    A obrigação do uso de capacetes também é uma regra legal, mesmo sem envolver a lealdade com os próximos. OK, o risco seria só do piloto, então ele poderia escolher se vai utilizar o capacete ou não, assim como no Supertuck, certo? Errado! O capacete não limita a pilotagem do atleta e não tira nenhum direito de escolha do que ele vai fazer dentro das pistas. Além do quê, previne danos maiores em caso de acidentes – o que dá mais liberdade para que os atletas desçam mais rápido ou se arrisquem mais, como por exemplo, pilotar em posição mais aerodinâmica.

    Por favor UCI, cuidem da segurança que compete a vocês, que é a sinalização do percurso, a utilização de barreiras próprias para uma situação de tombo, chegadas livres e sem elementos surpresa. Cuidem de instruir os espectadores a não se envolverem no percurso e com atletas, como acabou de acontecer na Vuelta a San Juan. Fiscalizem mais doping e menos altura de meias (sim, isso também aconteceu). Deixem que a pilotagem é por conta de quem está pilotando.

    Por Breno Bizinoto

    breno.bizinoto@blog.useiq.com.br


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