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    Por favor Pogi, não corra a Vuelta a España!

    Desde que eu comecei a acompanhar esse esporte ouvi falar sobre um feito impossível: ganhar as três Grandes Voltas no mesmo ano. Giro, Tour e Vuelta.

    Naquela época eu nem entendia muito bem a diferença entre Clássicas, Monumentos, Voltas e Grandes Voltas, mas sabia que existiam apenas três corridas com duração de 21 dias e prestígio muito grande.

    Mas por que ninguém nunca conseguiu vencer as três no mesmo ano? Onde estão aqueles atletas recordistas e históricos?

    Bom, a grande discussão aqui é se isso é possível – apesar de que desde o fim do Tour 2024, no último domingo, as opiniões mudaram um pouco.

    Eu sempre pensei ser impossível, mas ainda assim com bastante esperança de poder um dia assistir tal feito histórico. Lembro-me dos anos de Chris Froome, quando em determinado momento chegamos a acreditar que ele pudesse conquistar a tríplice coroa pela primeira vez.

    Não aconteceu. Nem ficamos decepcionados, logo entendemos que era impossível.

    21 dias de duração é uma pancada muito forte no corpo de qualquer atleta. Principalmente para o campeão, que foi quem mais fez força e tomou ataques de todos os lados, o tempo inteiro da prova.

    Agora imagina multiplicar isso por três? Sessenta e três dias de competição em alto nível em uma mesma temporada - é muita coisa.

    Bom, o Pogacar acabou de vencer as duas mais prestigiadas, Tour de France e Giro d’Italia no mesmo ano. Esse feito só foi alcançado até hoje por apenas 8 ciclistas na história. Desde 1998 que isso não acontecia.

    E aí o cara terminou o Tour super bem, com um sorriso no rosto e vencendo a última etapa, mostrando que a máquina está regulada e com o funcionamento perfeito.

    “Bora pra Vuelta fazer história?” era a pergunta que ele mais deve ter escutado.

    É óbvio que eu apostava alto que ele tem condições de vencer lá. É claro que eu gostaria de assistir esse momento único do esporte.

    Mas venho aqui explicar o motivo de eu ter mudado de opinião.

    O diretor técnico da UAE, Mauro Gianetti, disse que eles tomaram a decisão de não mandar o Pogacar para a Vuelta por que não faz sentido colocar uma carreira brilhante em risco.

    “Não vamos usar ele como uma ferramenta”, disse Mauro.

    Diretores técnicos, agentes e produtores costumam ser os vilões por trás de grandes estrelas. Eles são os caras que abusam da capacidade física e mental dos atletas, músicos e atores em prol de um cachê a mais.

    São eles que espremem a teta até sair sangue. Aí quando o atleta (ou músico) entra em depressão e para de performar, cai no esquecimento do público e tchau. É só buscar “novos talentos” de novo.

    Agentes e produtores são uma máquina de criar talentos descartáveis.

    O Diretor da UAE disse que não quer o Pogacar na Vuelta a España, alegando que o menino é novo e ainda está no início da carreira, com muitas conquistas para acontecerem. Buscar resultados muito grandes, todos de uma vez, seria uma arma apontada para um futuro brilhante, com muitos anos de pedal.

    É comum que os atletas (e o público) tenham ansiedade em querer um mundo de conquistas, todas de uma vez. É um espetáculo, mesmo que o circo pegue fogo no final.

    Precisamos entender o quão valioso é ter um técnico que sabe controlar essa ansiedade e preservar a vida útil dessa grande estrela que ele tem em mãos.

    Eles ganhariam muito dinheiro com essa Vuelta, mas o diretor abriu mão dessa possibilidade pensando em preservar a carreira e a saúde de Tadej Pogacar.

    Parabéns por isto, Mauro Gianetti!

    Quando entendemos que o planejamento de corridas é a parte mais sensível da carreira de um atleta, principalmente por que ele pode afetar a longevidade dele, aí entendemos o quão humano e ético o diretor da UAE está sendo ao abrir mão de todo o dinheiro, fama e recordes que eles poderiam conquistar na Vuelta a España 2024.

    Nós já perdemos vários atletas que não souberam administrar a ansiedade. E se Tadej Pogacar chegou até aqui, é por que ele está bem amparado de pessoas que sabem analisar os riscos e cuidar dele como um ser humano e não como uma máquina de bater recordes.

    E se por acaso a equipe mudar de ideia e decidirem colocar o Pogi na Vuelta – afinal, eles já abortaram as Olimpíadas e isso dá assunto pra mais um texto – nada do que discutimos aqui se torna inválido.

    Precisamos acreditar que uma possível participação na Vuelta 2024 seja muito consciente, torcendo sempre pela saúde do cara – já sabendo que em 2025 ele vai fazer um grande descanso com uma lacuna na temporada.

    E por último, não caiam no engano de acharem que ele dá conta da Vuelta só por que terminou o Tour sorrindo e com a performance lá em cima.

    “Quando você se sente muito bem, talvez seja o momento que você está mais perto de começar a se sentir mal” – foi o que escutei do meu treinador Hugo Prado, em um dia que passei feedbacks super positivos do meu treino e ele diminuiu todos os meus tempos prescritos para a semana seguinte.

    Sim, o planejamento dos treinos é algo muito complexo e qualquer excesso pode custar caro.

    Deixem o menino descansar. 2025 é logo ali.

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    1 comentário

    Belíssima perspectiva! Nos faz parar para pensar na máquina de moer carne que de fato é o esporte de alto rendimento, e aqui não é diferente. E belo conselho do Hugo, quem pedala sabe o quanto é real…

    Rodrigo Abreu

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